Comuns são as estratégias de devedores para se esquivarem do pagamento de seus débitos junto aos seus credores, chegando, infelizmente, a utilizarem-se de recursos ardilosos para tanto. Por esse motivo, fez-se necessária o amparo legal para proteção dos credores, dentre eles, pode-se citar a inserção realizada pela lei 8.245/91, da exceção à regra geral de impenhorabilidade do bem de família.
A referida lei acrescentou o inciso VII à lei Lei 8.009/90 – que trata da impenhorabilidade do bem de família, na qual garante-se que o referido imóvel não responda por qualquer tipo de dívida -, de modo que houve a ressalva da possibilidade de penhora por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação, ou seja, excluiu-se da regra de impenhorabilidade o bem de família dado como garantia pelo fiador no contrato locatício.
Tal exceção foi necessária para evitar os meios ardilosos e fraudulentos dos devedores para esquivarem-se de seus pagamentos, sem que houvesse qualquer consequência patrimonial, visto que a garantia contratual dada seria “intocável”.
Contudo, em recente e inovadora decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça, a Terceira Turma deste tribunal decidiu que o bem de família oferecido como caução em contrato de locação é impenhorável.
A ação tratou-se de execução de título extrajudicial, tendo como título executivo o contrato de locação, em que o locador moveu em face do locatário e do caucionante da relação locatícia, em virtude de inadimplência.
O caucionante, em sua defesa, pugnou pela impenhorabilidade do bem de família oferecido em caução como garantia do referido contrato, o que foi rejeitado em primeira instância, em sede de decisão interlocutória. Inconformado, esse interpôs Agravo de Instrumento, o qual teve seu provimento negado, motivo pelo qual houve a interposição de Recurso Especial, que recebeu a numeração processual 1.873.203-SP.
Em mérito recursal, alegou-se a violação dos artigos 1º e 3º da Lei nº 8.009/90, sustentando que a garantia prestada foi a de caução imobiliária, de modo que o imóvel objeto desta garantia, por ser bem de família, não pode ser penhorado. Além disso, alegou-se que o rol do artigo 3º da lei supra referida é taxativo e não prevê a exceção da caução imobiliária.
Assim, a finalidade do recurso visou definir se o imóvel oferecido como caução imobiliária em contrato de locação pode ser objeto de penhora, quando tal bem for considerado bem de família.
A relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, considerou que a exceção trazida no artigo 3º, VII da Lei 8.009/1990, refere-se à obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação, não havendo menção quanto à caução imobiliária, assim afirmando:
“[…] De fato, considerando que a possibilidade de expropriação do imóvel residencial é exceção à garantia da impenhorabilidade, a interpretação às ressalvas legais deve ser restritiva, sobretudo na hipótese sob exame, em que o legislador optou, expressamente, pela espécie (fiança), e não pelo gênero (caução), não deixando, por conseguinte, margem a dúvidas (REsp 866.027/SP, 5ª Turma, DJ 29/10/2007).”
Tendo em vista que a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo, que negou provimento ao Agravo de Instrumento do caucionante, sob o argumento de que “descabida a alegação de impenhorabilidade do bem de família, pois a caução do bem imóvel no contrato de locação (artigo 37, inciso I, da Lei número 8.245/91) configura hipoteca, que é hipótese de exceção à regra de impenhorabilidade, nos termos do artigo 3º, inciso V, da Lei número 8.009/90”, a Ministra Nancy Andrighi destacou que não se pode entender a caução imobiliária como hipoteca, visto que a exceção de penhora sobre o bem de família, disposta no o artigo 3º, V, da Lei 8.009/90, só incide em caso de hipoteca dada em garantia de dívida própria, e não de dívida de terceiro.
Sob tais argumentos, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, considerou que o rol das hipóteses de exceção, previsto na Lei 8.009/1990, é taxativo, reformando o acórdão proferido pelo TJSP, reconhecendo, portanto, a impenhorabilidade de bem de família oferecido como caução em contrato de locação.
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FERNANDA MIRANDA é advogada da equipe Contenciosa e Métodos Resolutivos de controvérsias do Assis e Mendes Sociedade de Advogados.