A implementação da inteligência artificial (IA) no Judiciário brasileiro é um marco significativo, refletindo um esforço contínuo para modernizar e aprimorar a eficiência do sistema jurídico.
De acordo com a pesquisa “Tecnologia Aplicada à Gestão dos Conflitos no Âmbito do Poder Judiciário Brasileiro”, conduzida pelo Centro de Inovação, Administração e Pesquisa do Judiciário da Fundação Getúlio Vargas (CIAPJ/FGV) e coordenada pelo ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Luis Felipe Salomão, cerca de metade dos tribunais brasileiros já possui projetos de IA em operação ou em desenvolvimento.
- O Panorama da IA nos Tribunais Brasileiros
A pesquisa da FGV revelou que a maioria dos Tribunais e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) já utilizam projetos de Inteligência Artificial.
A digitalização da Justiça é vital para lidar com a alta demanda processual. Durante a pandemia de Covid-19, a tecnologia foi crucial para manter a produtividade dos tribunais, evidenciando a importância da IA em tempos de crise.
Segundo a pesquisa da FGV, os Tribunais Brasileiros utilizam sistemas de IA em quatro categorias principais:
- Atividades Administrativas: Incluem ferramentas como chatbots para responder a dúvidas sobre gestão de pessoas e sistemas de monitoramento de segurança.
- Atividades Finais Administrativas: Tecnologias que auxiliam na transcrição de audiências e na gestão de processos.
- Apoio à Decisão: Sistemas que ajudam na elaboração de minutas de decisões e na análise de casos com repercussão geral.
- Reconciliamento: Ferramentas que utilizam dados de processos anteriores para identificar casos com potencial de conciliação.
- Exemplos de sistemas de IA utilizados nos Tribunais
A Inteligência Artificial está melhorando a gestão dos processos no Judiciário Brasileiro, aumentando a eficiência e produtividade. Esses sistemas demonstram a crescente integração da IA, trazendo mais agilidade ao sistema jurídico.
Abaixo, destacamos alguns dos principais sistemas implementados:
- Supremo Tribunal Federal (STF): o sistema VICTOR, desenvolvido em parceria com a Universidade de Brasília (UnB), é uma IA capaz de separar e classificar peças processuais e identificar temas de repercussão geral. Este sistema é reconhecido por analisar em 5 segundos, processos que demoravam cerca de 44 minutos para serem analisados;
- Superior Tribunal de Justiça (STJ): o ATHOS é um programa que identifica e monitora temas repetitivos, automatizando o recebimento de recursos de admissibilidade recursal por meio de critérios semânticos;
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- Tribunal Superior do Trabalho (TST): faz uso do BEM-TE-Vi, que é uma solução de apoio aos gabinetes para identificar casos semelhantes, otimizando o trabalho dos ministros;
- Tribunal de Justiça de Rondônia (TJ-RO): utiliza o SINAPSES, que é um sistema de inteligência artificial desenvolvido pelo TJ-RO, em parceria com o Conselho Nacional de Justiça-CNJ, que visa automatizar e otimizar processos judiciais, oferecendo suporte na análise de documentos e na tomada de decisões;
- Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ): o projeto “Resolução Online de Conflitos” faz uso de chatbots para resolver casos simples de conciliação e fornecer informações administrativas;
- Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJ-DF): utiliza o ÁRTEMIS – sistema detector de demandas repetitivas ou predatórias.
- Desafios e Considerações Legais
Embora a IA traga muitos benefícios, sua implementação no Judiciário brasileiro apresenta desafios, especialmente no que diz respeito à justiça e à imparcialidade.
A Resolução 332 do CNJ é crucial, pois define diretrizes sobre ética, transparência e governança na utilização da IA no Judiciário. Ela proíbe decisões automatizadas no processo penal e destaca a importância de evitar discriminações algorítmicas. Essas diretrizes são essenciais para garantir que a tecnologia amplie a justiça sem comprometer sua integridade.
Além disso, a resolução aborda a necessidade de regulamentar as IAs generativas, estabelecendo normas claras sobre segurança e risco. Esta regulamentação é vital para integrar novas tecnologias de forma segura e responsável. Cabe aos profissionais do direito e aos administradores da justiça assegurar que a IA contribua para um sistema jurídico mais eficiente e justo, respeitando os princípios fundamentais da justiça.
Outro desafio é a necessidade de regulamentação das IAs generativas, que são capazes de criar textos, imagens, vídeos e até mesmo tomar decisões baseadas em grandes volumes de dados, possuem um potencial transformador, mas também apresentam riscos que precisam ser cuidadosamente gerenciados.
Dentre outros desafios na implementação de IA generativa, podemos citar as seguintes questões:
- Segurança: proteção contra ameaças cibernéticas e segurança dos dados judiciais;
- Risco de Discriminação: as IAs generativas devem ser avaliadas para evitar discriminação. Transparência nos algoritmos e mecanismos de correção de vieses são fundamentais para garantir decisões justas;
- Transparência: decisões automatizadas devem ser compreensíveis e auditáveis para garantir confiança e justiça;
- Governança e Responsabilidade: definir responsabilidades claras para revisar e corrigir decisões erradas.
- Atualização e Capacitação: as regulamentações devem ser atualizadas continuamente e profissionais capacitados para usar essas ferramentas.
- O Futuro da IA no Judiciário
A adoção da IA no Judiciário brasileiro está começando, mas seu potencial para transformar a administração da justiça é enorme. A tecnologia promete modernizar e melhorar a eficiência em um sistema sobrecarregado, acelerando processos, reduzindo erros e permitindo que recursos humanos se concentrem em tarefas mais complexas.
Além de otimizar o trabalho diário, a IA pode melhorar a qualidade e a acessibilidade da justiça para todos. É importante, no entanto, que essa implementação seja acompanhada de uma análise ética e legal rigorosa para garantir o uso justo e equitativo da tecnologia.
Profissionais do direito e administradores da justiça devem garantir que a IA contribua para um sistema jurídico mais eficiente e justo. Quando bem aplicada, a inovação tecnológica pode revolucionar o Judiciário brasileiro, trazendo benefícios significativos para a sociedade.
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Natalia Queiróz Mulati Cassim é advogada da equipe de Contenciosa e Métodos Resolutivos de Controvérsias do Assis e Mendes. Pós-graduada em Direito Civil, Processo Civil e Direito Empresarial e Pós-graduanda em Direito Digital.