Recentemente, o Supremo Tribunal de Justiça (STF), ao julgar o Recurso Extraordinário n° 1075412, fixou a tese em tema de repercussão geral, definindo as condições em que as empresas jornalísticas podem ser responsabilizadas civilmente, ou seja, obrigadas a pagar indenização, caso publiquem uma entrevista na qual o entrevistado falsamente atribua a outra pessoa a prática de um crime e caso tenha descumprido o seu dever de comprovar a veracidade dos fatos.
O caso concreto se refere a uma entrevista publicada pelo Diário de Pernambuco em maio de 1995. O entrevistado alegou que o ex-deputado Ricardo Zaratini foi o responsável por um atentado a bomba em 1966, no Aeroporto dos Guararapes/PE, resultando em quatorze feridos e duas mortes. O jornal recorreu ao STF contra a decisão do STJ, que confirmou a condenação ao pagamento de indenização fixada em segunda instância. O STF manteve a decisão do STJ, considerando que na época da publicação da reportagem, já se sabia que a informação era falsa.
No Recurso Extraordinário n° 1075412, foi fixada a seguinte tese de repercussão geral pelo STF (grifei):
“1. A plena proteção constitucional à liberdade de imprensa é consagrada pelo binômio liberdade com responsabilidade, vedada qualquer espécie de censura prévia. Admite-se a possibilidade posterior de análise e responsabilização, inclusive com remoção de conteúdo, por informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas, e em relação a eventuais danos materiais e morais. Isso porque os direitos à honra, intimidade, vida privada e à própria imagem formam a proteção constitucional à dignidade da pessoa humana, salvaguardando um espaço íntimo intransponível por intromissões ilícitas externas. 2. Na hipótese de publicação de entrevista em que o entrevistado imputa falsamente prática de crime a terceiro, a empresa jornalística somente poderá ser responsabilizada civilmente se: (i) à época da divulgação, havia indícios concretos da falsidade da imputação; e (ii) o veículo deixou de observar o dever de cuidado na verificação da veracidade dos fatos e na divulgação da existência de tais indícios”.
O entendimento do STF foi definido no sentido de que os veículos jornalísticos podem enfrentar responsabilidade civil caso publiquem declarações falsas de entrevistados, especialmente se houver evidências claras de falsidade na época da publicação e se o veículo não tiver cumprido adequadamente com o seu dever de verificar a veracidade dos fatos.
A decisão destaca a importância da minuciosa verificação dos fatos publicados e a necessidade de uma abordagem equilibrada para assegurar que a imprensa possa continuar desempenhando seu papel democrático, sem ficar sujeita a restrições indevidas ou a riscos legais.
A regra geral é a isenção de responsabilidade, porém esta é admitida nos casos de negligência na apuração dos fatos e caso existam evidências concretas de falsidade das acusações.
No julgamento, o STF entendeu que:
“No desempenho da função jornalística, as empresas de comunicação não podem descurar de seu compromisso com a veracidade dos fatos ou assumir uma postura displicente ao divulgar fatos que possam macular a integridade moral de terceiros.”
Assim, tendo em vista o entendimento exposto no julgamento, bem como a tese de repercussão geral fixada, há a possibilidade de remoção do conteúdo indevidamente publicado, bem como de responsabilização da empresa jornalística, caso esta não tenha apurado a veracidade dos fatos, bem como se na época da divulgação, havia indícios concretos da falsidade da imputação.
A tese estipula que, embora a censura prévia seja proibida, a Justiça pode determinar a retirada de conteúdo se for comprovadamente injurioso, difamatório, calunioso ou falso.
O Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros, ensina que:
“Art. 2º Como o acesso à informação de relevante interesse público é um direito fundamental, os jornalistas não podem admitir que ele seja impedido por nenhum tipo de interesse, razão por que:
I – a divulgação da informação precisa e correta é dever dos meios de comunicação e deve ser cumprida independentemente de sua natureza jurídica – se pública, estatal ou privada – e da linha política de seus proprietários e/ou diretores”.
O entendimento do STF também vai ao encontro do estipulado no artigo 8º do mencionado Código de Ética, que leciona:
“Art. 8º O jornalista é responsável por toda a informação que divulga, desde que seu trabalho não tenha sido alterado por terceiros, caso em que a responsabilidade pela alteração será de seu autor.”
Tendo em vista o entendimento do STF já estabelecido sobre o direito ao esquecimento, a tese abre a possibilidade de acionamento do judiciário para remoção de conteúdos que, conforme mencionado, se enquadrem nas categorias de falsidade, injúria, difamação ou calúnia.
Desta forma, qualquer pessoa (física ou jurídica) que esteja enfrentando uma situação em que seu nome esteja indevidamente vinculado em uma notícia sabidamente falsa, com conteúdo comprovadamente injurioso, calunioso ou difamatório, pode se socorrer do judiciário para requerer a remoção do conteúdo. Além disso, é possível que a empresa jornalística seja responsabilizada civilmente caso seja comprovado que publicou entrevista em que o entrevistado atribui a outrem fato sabidamente falso, devendo ser demonstrado que o veículo de imprensa não cumpriu com o seu dever de verificar a veracidade dos fatos antes de publicar o conteúdo.
Para saber mais sobre este e outros temas relacionados à proteção de dados pessoais, direito ao esquecimento, LGPD, direito civil e direito digital, a equipe do Assis e Mendes possui especialistas prontos para atender as suas necessidades e de sua empresa. Entre em contato conosco pelo site www.assisemendes.com.br.
Natalia Queiróz Mulati Cassim é advogada da equipe de Contenciosa e Métodos Resolutivos de Controvérsias do Assis e Mendes. Pós-graduada em Direito Civil, Processo Civil e Direito Empresarial.