O uso de softwares livres (ou Open Source) tornou-se uma prática comum no ecossistema de tecnologia, especialmente entre empresas que buscam soluções escaláveis e com menor custo operacional. Ao eliminar a necessidade de aquisição de licenças tradicionais, essas ferramentas oferecem funcionalidades robustas — em muitos casos comparáveis (ou superiores) às de softwares proprietários.
Contudo, por trás da proposta de acessibilidade e inovação, surgem importantes questionamentos: esses softwares são juridicamente seguros? Quais são os riscos envolvidos?
A seguir, exploramos os principais aspectos a serem considerados, sob uma perspectiva técnica e jurídica.
O que caracteriza Softwares livres?
Todo software é estruturado a partir de um código-fonte — um conjunto de instruções escritas em linguagens de programação que determinam seu funcionamento.
Nos softwares livres, esse código é disponibilizado de forma aberta e pública, permitindo que qualquer pessoa acesse, revise, adapte ou distribua novas versões. Em geral, essas ferramentas são mantidas por comunidades técnicas descentralizadas e distribuídas gratuitamente, com melhorias contínuas feitas de forma colaborativa.
Quais os riscos práticos de sua adoção?
Apesar das vantagens, a utilização de softwares livres deve ser acompanhada de precauções. Entre os principais riscos:
1. Vulnerabilidades de segurança
A abertura do código-fonte, embora permita auditoria e melhoria por especialistas, também pode ser explorada por agentes mal-intencionados. Cibercriminosos com conhecimento técnico podem identificar brechas e arquitetar ataques com base em vulnerabilidades conhecidas.
Se o software for utilizado, por exemplo, na prestação de serviços a terceiros ou como parte de uma infraestrutura crítica, a responsabilidade por danos decorrentes de falhas de segurança pode recair sobre a empresa usuária.
2. Ausência de garantias e suporte
Por sua natureza comunitária e gratuita, softwares livres geralmente não contam com garantias contratuais, SLAs (Service Level Agreements) ou suporte técnico dedicado. Em ambientes corporativos, isso pode significar indisponibilidades prolongadas, dificuldade para resolução de bugs e impacto direto na operação do negócio.
E sob o ponto de vista jurídico?
1. Licenciamento e propriedade intelectual
Os softwares livres são distribuídos sob diferentes tipos de licenças (como GPL, MIT, Apache, BSD), cada uma com regras próprias de uso, modificação e redistribuição. A falta de atenção a essas licenças pode levar a infrações, como a obrigação de abertura do código de soluções derivadas ou até violações de direitos autorais.
Além disso, é comum que partes do código sejam reutilizadas de outras fontes — nem sempre de forma documentada ou legítima. Isso pode gerar disputas sobre a titularidade do código e responsabilização por uso indevido de propriedade intelectual de terceiros.
2. Riscos à privacidade e à LGPD
Outro aspecto crítico é a possibilidade de softwares livres conterem códigos ocultos ou mecanismos de rastreamento. Quando esses softwares são utilizados para tratar dados pessoais, sem que haja uma auditoria ou avaliação de segurança adequada, há o risco de descumprimento da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) — com implicações administrativas, judiciais e reputacionais.
Como mitigar riscos e adotar boas práticas para uso de Softwares Livres?
Softwares livres são, sem dúvida, ferramentas valiosas para a inovação tecnológica e a democratização do acesso à informação. Entretanto, seu uso em ambientes empresariais exige cuidados estruturados. Recomendamos:
- Adoção de critérios de curadoria na escolha de ferramentas;
- Avaliação jurídica das licenças envolvidas e cláusulas de uso;
- Due diligence técnica e jurídica em casos de integração com produtos ou serviços;
- Auditoria periódica quanto a questões de segurança e privacidade;
- Previsão contratual de responsabilidades em relações com terceiros que envolvam software livre.
Conclusão
A utilização de softwares livres não é, por si só, um risco — mas exige responsabilidade. Quando bem avaliados e integrados de forma consciente ao modelo de negócios, eles podem representar soluções eficientes, seguras e sustentáveis.
Se a sua empresa utiliza ou pretende incorporar softwares de código aberto em sua operação, é essencial contar com uma análise multidisciplinar, envolvendo profissionais das áreas jurídica e de tecnologia, para garantir conformidade legal, proteção da operação e viabilidade estratégica de longo prazo.
Sobre o Autor
João Paulo Gomes Massaro é advogado da área Consultiva do Assis e Mendes, com ampla experiência em Direito Contratual, Civil, Empresarial e Digital. Mestre em Direito com foco em Direitos Humanos e Políticas Públicas. Atua no suporte jurídico especializado para empresas e indivíduos nas áreas civil, digital e societário, auxiliando em decisões estratégicas.