IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA OFERECIDO COMO CAUÇÃO IMOBILIÁRIA NO CONTRATO DE LOCAÇÃO

19 de abril de 2021

Comuns são as estratégias de devedores para se esquivarem do pagamento de seus débitos junto aos seus credores, chegando, infelizmente, a utilizarem-se de recursos ardilosos para tanto. Por esse motivo, fez-se necessária o amparo legal para proteção dos credores, dentre eles, pode-se citar a inserção realizada pela lei 8.245/91, da exceção à regra geral de impenhorabilidade do bem de família.

 

A referida lei acrescentou o inciso VII à lei Lei 8.009/90 – que trata da impenhorabilidade do bem de família, na qual garante-se que o referido imóvel não responda por qualquer tipo de dívida -, de modo que houve a ressalva da possibilidade de penhora por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação, ou seja, excluiu-se da regra de impenhorabilidade o bem de família dado como garantia pelo fiador no contrato locatício.

 

Tal exceção foi necessária para evitar os meios ardilosos e fraudulentos dos devedores para esquivarem-se de seus pagamentos, sem que houvesse qualquer consequência patrimonial, visto que a garantia contratual dada seria “intocável”.

 

Contudo, em recente e inovadora decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça, a Terceira Turma deste tribunal decidiu que o bem de família oferecido como caução em contrato de locação é impenhorável.

 

A ação tratou-se de execução de título extrajudicial, tendo como título executivo o contrato de locação, em que o locador moveu em face do locatário e do caucionante da relação locatícia, em virtude de inadimplência.

 

O caucionante, em sua defesa, pugnou pela impenhorabilidade do bem de família oferecido em caução como garantia do referido contrato, o que foi rejeitado em primeira instância, em sede de decisão interlocutória. Inconformado, esse interpôs Agravo de Instrumento, o qual teve seu provimento negado, motivo pelo qual houve a interposição de Recurso Especial, que recebeu a numeração processual 1.873.203-SP.

 

Em mérito recursal, alegou-se a violação dos artigos 1º e 3º da Lei nº 8.009/90, sustentando que a garantia prestada foi a de caução imobiliária, de modo que o imóvel objeto desta garantia, por ser bem de família, não pode ser penhorado. Além disso, alegou-se que o rol do artigo 3º da lei supra referida é taxativo e não prevê a exceção da caução imobiliária.

 

Assim, a finalidade do recurso visou definir se o imóvel oferecido como caução imobiliária em contrato de locação pode ser objeto de penhora, quando tal bem for considerado bem de família.

 

A relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, considerou que a exceção trazida no artigo 3º, VII da Lei 8.009/1990, refere-se à obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação, não havendo menção quanto à caução imobiliária, assim afirmando:

 

“[…] De fato, considerando que a possibilidade de expropriação do imóvel residencial é exceção à garantia da impenhorabilidade, a interpretação às ressalvas legais deve ser restritiva, sobretudo na hipótese sob exame, em que o legislador optou, expressamente, pela espécie (fiança), e não pelo gênero (caução), não deixando, por conseguinte, margem a dúvidas (REsp 866.027/SP, 5ª Turma, DJ 29/10/2007).”

 

Tendo em vista que a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo, que negou provimento ao Agravo de Instrumento do caucionante, sob o argumento de que “descabida a alegação de impenhorabilidade do bem de família, pois a caução do bem imóvel no contrato de locação (artigo 37, inciso I, da Lei número 8.245/91) configura hipoteca, que é hipótese de exceção à regra de impenhorabilidade, nos termos do artigo 3º, inciso V, da Lei número 8.009/90”, a Ministra Nancy Andrighi destacou que não se pode entender a caução imobiliária como hipoteca, visto que  a exceção de penhora sobre o bem de família, disposta no o artigo 3º, V, da Lei 8.009/90, só incide em caso de hipoteca dada em garantia de dívida própria, e não de dívida de terceiro.

Sob tais argumentos, ​​a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, considerou que o rol das hipóteses de exceção, previsto na Lei 8.009/1990, é taxativo, reformando o acórdão proferido pelo TJSP, reconhecendo, portanto, a impenhorabilidade de bem de família oferecido como caução em contrato de locação. 

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FERNANDA MIRANDA é advogada da equipe Contenciosa e Métodos Resolutivos de controvérsias do Assis e Mendes Sociedade de Advogados.

 

 

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